A rota natural de todo navio que sai de países da Ásia, como China, Taiwan e Índia, com destino à Europa é passar pelo Oceano Índico, seguir pelo Golfo de Áden, atravessar o estreito de Bab el-Mandeb, navegar pelo Mar Vermelho, chegar ao Canal de Suez, para, enfim, aportar no continente europeu.
Esse trajeto, pelo qual passa boa parte do comércio mundial de gás, petróleo e outros produtos (veja no quadro), está hoje rodeado por conflitos internos e externos envolvendo países na região do Oriente Médio, África e Ásia. Além da guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas, ocorrências militares estão em curso no Irã, Líbano, Síria, Iêmen, Somália e Paquistão.
Desde meados de janeiro, o grupo xiita houthi, que luta contra o governo do Iêmen há duas décadas, vem realizando diversos ataques com mísseis e drones a navios comerciais e militares. Assim, grandes empresas logísticas e petroleiras passaram a optar por não mais navegar pela região e fazer seus produtos chegarem à Europa dando a volta por todo o continente africano, passando pelo Índico e pelo Cabo da Boa Esperança e subindo para o hemisfério norte pelo Oceano Atlântico.
Mais longe, mais caro
A mudança, apesar de uma opção segura, é mais cara. “A estimativa é de que os custos aumentem, porque essa nova rota é mais extensa — o transporte que levaria 25 dias agora leva 34”, diz Alexandre Pires, professor do Ibmec São Paulo. O impacto no custo da logística foi sentido logo nos primeiros 15 dias de conflito: o preço do contêiner (estrutura em que as cargas são transportadas) cresceu 15%. “De alguma forma as empresas terão que repassar o aumento para os clientes, o que refletirá em aumento de preços para o consumidor, não só na Europa, como em todo o mundo”, afirma Pires.
O preço do petróleo já subiu em consequência da tensão, com o Brent (petróleo bruto) ultrapassando a marca dos 80 dólares. “A região também é uma importante via para componentes eletrônicos vindos da Ásia, que deverão ter o preço afetado”, afirma Pires.
Impacto na cadeia produtiva
Se a situação na região persistir, é possível que haja um impacto econômico ainda maior. As atuais cadeias produtivas, montadas ao longo dos anos 1990 e 2000, dependem muito do Canal de Suez como passagem. Segundo Pires, se os conflitos continuarem, muitas empresas europeias vão ter que repensar a organização dessa produção terceirizada, aderindo ao nearshoring. “Elas podem migrar a produção de países como China e Índia para a Turquia, por exemplo.”
Diante dessa possibilidade, a pergunta que fica é: como a China reagirá a esse xadrez comercial? Até o momento, a segunda nação mais poderosa do mundo tem se limitado a fazer apelos para que os ataques a navios civis cessem, mas será que se manterá assim se as importações e exportações do país forem fortemente afetadas?